O mundo da tatuagem, em minha opinião, apresenta muita semelhança com um grande jogo de RPG.
Todas as peças dessa saga estão lá e podem ser facilmente identificadas até mesmo por jovens heróis. Temos vendedores de artefatos (tattoo supply), upgrade de habilidades (cursos online), ganhos de pontos de experiência (aprendizado diário), diferentes Clãs (estúdios de tattoo), Classes de personagens (estilos de tattoo) e até mesmo ferramentas forjadas por grandes mestres (bobinas ou rotativas assinadas).
Se você começou essa saga agora deve estar tão perdido quanto qualquer personagem de RPG, que normalmente acorda em sua cama após algum pesadelo, sem ter ideia por onde começar.
Nesse momento, como personagem de LEVEL 1, você recebe o conhecido “chamado do herói” e decide ser um tatuador ou tatuadora. Sua missão começa sem qualquer arma poderosa nas mãos, algumas moedas no bolso e todas as incertezas do mundo!
Oi, para quem não nem me conhece, me chamo Leo Freitas, tenho 34 anos e sou tatuador, designer e produtor audiovisual. Em meu instagram (@tatuinque), crio muito conteúdo informativo e recebo, diariamente, dezenas de mensagens de tatuadores e tatuadoras de todos os níveis.
As maiores perguntas ainda são sobre desenho, criatividade e aspectos técnicos dos equipamentos. Esse artigo representa um pouco dessas dúvidas que recebo todos os dias.
João e Maria serão nossos personagens fictícios do mundo da tatuagem que chamarei de TATTURYA. Eles receberam o tal chamado do herói, cada um à sua maneira. Ambos vêem tatuagem como uma possível profissão mas ainda têm incertezas, devido ao antiquado preconceito que ainda existe sobre esse tipo de trabalho.
João foi motivado pelos pedidos incessantes da sua família de que ele precisaria fazer algo da sua vida, sendo que “algo” é subjetivo demais para alguém com sua idade. Aos 19 anos ele tem algumas moedas guardadas, possui talento com desenho com tons de preto, mas quase nenhuma habilidade com cores. Suas skills são muito aprimoradas na classe de personagem Blackworker, mesmo que ele ainda não faça ideia disso.
Já a Maria, com 20 anos, sempre teve curiosidade de conhecer os segredos da arte e por conta disso já havia pesquisado bastante sobre os mistérios do mundo de TATTURYA. Ela investiu boa parte das suas poucas moedas em livros místicos com técnicas de realismo e aquarela.
Maria seria uma personagem Multiclass. Apesar de ser muito mais habilidosa que o João, mal sabia ela que o seu maior desafio seria enfrentar as diferenças que TATTURYA apresentaria para personagens do sexo feminino, com menores ganhos de moedas, preconceito e uma árdua batalha por igualdade dentro dos clãs.
Os dois personagens não se conhecem mas saíram em uma side quest para comprar equipamentos no mesmo dia, em direção à mesma loja.
Esses locais são visitados por aventureiros de todo o mundo de Tatturya e possui ferramentas e acessórios para todos os tipos de habilidades. A maioria dos itens mais comuns não requerem nenhum tipo de conhecimento prévio sobre eles. Já outros são artefatos raros e só são recomendados para grandes campeões, devido à complexidade de manuseio e valor.
Existe sempre uma grande chance dos novatos abandonarem a jornada, por isso o investimento em equipamentos precisa ser equilibrado e bem pensado.
Opa! Eis aqui um ponto importante que deve ser considerado: o que você vai precisar no começo precisa acompanhar o nível técnico que você tem, mas aconselho que não fique estagnado naquele equipamento por muito tempo só porque ele “funciona”. O fato é que, assim como um jogo de video game, é possível prosseguir usando uma pequena faquinha que tira pouquissimo dano, mas com o tempo os desafios ficarão cada vez maiores. Se seus desafios não estão aumentando com o passar do tempo, pode ter algo errado na forma que você está administrando a sua jornada.
Já na loja, João ficou perdido em meio a tantas opções e preferiu seguir a orientação de uma vendedora (que tinha um estilo bem arrojado e muitas tatuagens) para montar seu kit básico.
Ele até tentou mostrar os desenhos que gostava de fazer mas como a loja estava muito movimentada não recebeu atenção de ninguém. Após algumas explicações que não fizerem o menor sentido pra ele, João comprou um kit básico, contendo uma fonte de fabricação própria da loja, uma máquina elétrica “popular”, tintas elétricas, pedal artesanal (também próprio da loja) e diversas agulhas de numerações aleatórias.
Aliás, o maior susto do joão foi descobrir que precisaria perder boa parte das coisas que usaria no processo de descarte a cada tatuagem. Para muitos iniciantes, tudo parece sempre um pouco mais fácil e barato.
Maria foi mais cautelosa. Esbarrou com João já indo embora enquanto ela ainda anotava e comparava preços dos itens com outras lojas. Pesquisou bastante antes de montar seu próprio kit.
Questionou tanto a funcionalidade de algumas coisas que irritou a vendedora descoladinha (que mostrou não ter paciência nenhuma com novas aventureiras).
Infelizmente, em alguns casos, o primeiro vilão de personagens de LEVEL 1 está em uma dessas lojas, como se fosse o primeiro “Chefe de Fase”. E infelizmente, devido aos poucos pontos de experiência, os novatos podem ser facilmente derrotados e desmotivados no início do game.
Por fim, Maria optou por itens mais robustos que o nível dela e certamente precisará de mais experiência para aproveitá-los melhor. Comprou máquina Transversal e fonte Elétrica, pois leu em alguns pergaminhos antigos que aqueles serviriam mais para o que ela se propunha a fazer em sua jornada em TATTURYA. Precisaria, porém, economizar novamente para comprar itens de biossegurança e outros acessórios indispensáveis.
Diferente de João, que comprou todo o kit básico e já iniciará seus estudo em pele artificial, Maria irá esperar um pouco mais para iniciar sua jornada, pois ainda faltaram diversos itens essenciais e suas moedas esgotaram.
Existem diversos perfis de iniciantes. O que recomendo é que façam o investimento inicial dentro da sua possibilidade mas prestem muita atenção nas armadilhas, especialmente com opiniões de colegas ou dentro das lojas. Não devemos deixar de ouvir quem tem mais experiências que nós, jamais! Apenas, porém, sempre equilibrar e filtrar o que nos dizem. Somos artistas diferente, com ideias e perfis distintos.
Algumas pessoas possuem grande conhecimento teórico, mas não prático. Conviver diariamente com tatuagem é ainda muito diferente de colocar a mão na massa por meses ou anos.
Quando fiz a minha primeira compra em loja de tattoo, comprei muito material em excesso por pura indicação de outras pessoas. Tenho alguns desses materiais até hoje e tenho certeza que jamais irei usar, pois não têm nada a ver com o meu estilo de tattoo atual.
Por outro lado, se eu tivesse optado por esperar muito mais, poderia ter perdido aquela motivação inicial e talvez até prejudicado bastante minha jornada.
Com essa experiência de compra os dois aventureiros subiram de nível e agora, como personagens de LEVEL 2, já podem integrar os clãs que estejam aceitando novos integrantes.
Resta saber qual caminho irão seguir. Para alguns, treinar como nômades e explorar de forma solitária os mistérios de TATTURYA é uma boa opção. Para outros, a disciplina dos clãs e convívio com outros heróis é muito mais importante.
Maria e João iniciaram sua aventura cada um à sua maneira. Ganharão novas habilidades, farão melhorias dos seus itens, amizades com NPCs e conhecerão grandes mestres (e até mesmo vilões terríveis).
É um pouco assustador e tudo pode parecer muito difícil, mas apesar de todos esses fatores externos a maior batalha de qualquer artista de tattoo sempre será a luta pela própria personalidade.
Obrigado por acompanharem até aqui. Estejam sempre bem e com saúde. Até logo!
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