Quando temos modificações corporais, talvez o que mais escutamos é:
“POR QUAL MOTIVO?”
Sendo assim, eu te pergunto: é somente por um resultado estético?!
Sob esse ponto de vista, eu costumo chamar essas modificações de rituais.
Em primeiro lugar, esses rituais tem como objetivo definir uma passagem de fases e igualmente auxiliar o indivíduo a superar as crises, com uma sensação de grande significado, uma ampliação de consciência, uma mudança de personalidade assim como o ingresso em um novo status de vida na comunidade.
De acordo com essa perspectiva, podemos colocar nesse patamar uma mudança de país, um corte novo de cabelo, uma festa de aniversário, um piercing e igualmente uma tatuagem. São ritos de passagem.
A foto acima é da Tribo Surma, Ethiopia. Esse tradicional adorno é utilizado pela maioria das mulheres adultas Suri. Antes de casarem (14-15 anos), a mãe da adolescente realiza a primeira perfuração, com um pedaço de madeira, e a dilatação ocorre aos poucos, com pratos de lama. O tamanho da placa indica a quantidade de gado que deverá ser pago como preço pela noiva.
Os incisivos inferiores devem ser removidos para acomodar o prato. O lábio detentor do recorde mundial possui 59.5cm de dilatação.
Acima de tudo, em cada nova modificação corporal existe a comprovação de uma capacidade de superação, de enfrentar os medos, seus limites físicos e mentais.
E, em contrapartida a isso, eu como perfuradora, escuto muito:
“Meu sonho é um piercing no nariz, mas ele – o nariz – é feio!”
Assim sendo, minha resposta é sempre a mesma: vamos adorná-lo e você terá mais um motivo pra gostar dele.
É um novo conceito e antes de tudo, uma renovação.
A foto acima é de Chin Tattoo, Myanmar. A origem das tatuagens faciais na região é desconhecida, mas alguns acreditam que a prática teve início durante o reino dos Reis, onde a realeza costumava invadir vilas pra capturar mulheres jovens. Os homens das tribos deveriam tatuar suas mulheres para que elas ficassem feias e fossem salvas da escravidão.
Dessa forma, eu acredito que o nosso trabalho como modificadores é justamente tentar ajudar cada pessoa a ressaltar – ou disfarçar – aquilo que tem de mais bonito ou diferente.
À princípio, vamos tentar devolver à essa pessoa mais confiança, mais autoestima e uma maior auto percepção. Nosso papel nesse ritual de passagem é muito sério e importante.
Um adorno nunca será só um adorno, existindo, assim, uma ressignificação para quem está disposto a recebê-lo.
Mantendo esse ponto de vista como profissionais, temos o dever de tratar o corpo do outro com muito respeito, assim como temos o dever de respeitar a ancestralidade das modificações corporais.
Veja algumas modificações corporais pelo mundo:
Fotografia 1: Ritual vegetariano em Phuket, Tailândia. Tem como objetivo se livrar dos espíritos malignos e atrair a sorte para as comunidades locais. Acontece desde 1825. Os homens ficam por meses sem ingerir carne e graças aos poderes dos espíritos que os possuem, podem se perfurar com diversos instrumentos.
Fotografia 2: Tribo Afar, Danakil. Serrar os dentes é um ritual para manter o equilíbrio entre corpo e alma. Os procedimentos são realizados para deixar as almas felizes, satisfeitas com seus corpos e evitar a morte. É feito apenas em mulheres, para que elas sejam consideradas mais bonitas e possam manter os casamentos.
Fotografia 3: Pongal Vattapalai, Sri Lanka. É um festival dedicado ao Deus Sol e o solstício índico, quando o sol entra na 10º casa do zodíaco. É realizado para uma colheita bem sucedida e milhares de refeições são servidas para a população.
Fotografia 4
Fotografia 5
Fotografia 4: Voodoo, Bopa. Um dos melhores jeitos de verificar se alguém é parte da cultura Voodoo ou não, é olhar seus ombros: Se você notar pequenas escarificações, ela é um Voodoo adepto.
Fotografia 5: Tribo Kayans, Tailandia. São refugiadas e começam a colocar os anéis quando crianças. É adicionado um anel por cada ano sobrevivido. Comumente colocados no pescoço, onde o mesmo não é esticado e sim os ombros empurrados pra baixo. Elas podem levar até 2 horas pra remover um anel do pescoço e costumam mantê-los até pra dormir. Para proteger a pele dos cortes, elas utilizam folhas.
Fotografia 6: Dia da Ashura: É o décimo dia do Moarrão no calendário islâmico, celebrado pelos Xiitas como o dia do violento martírio de Huceine Ibne Ali, neto do profeta Maomé. A comemoração pelo dia tem base na dor: autoflagelação e sangue.
Fotografia 7: Tribo Otammari, Benin. Quando um membro da tribo faz 10 anos, eles provocam centenas de cicatrizes no rosto, chamadas de “Tchoudanfas”, usando uma agulha muito fina. É um meio utilizado pela tribo para que o “mal” possa escapar do corpo.
Fotografia 8: Pampanga, Filipinas. Na semana Santa, é de prática comum a autoflagelação para comemorar o sofrimento de Jesus Cristo.