Reflexões: o interno e o externo

Você já parou para pensar o motivo de se identificar com uma tatuagem e não com outra? Nesse texto, o interno e o externo andam juntos.

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Eu acredito que o interno e o externo estão em harmonia. Fazendo um breve paralelo: não é à toa que a cultura hindú, além de trabalhar grandemente na religiosidade e na medicina corporal ayurveda, também possui uma estética ornamental tão rica e detalhada.
Isso se apresenta na maioria das culturas milenares orientais, pois elas interconectam o corpo e a cultura, o interno e o externo, como se estivessem em fluxo. Uma visão holística sobre a vida. Em todo caso, se o interno e o externo estão em consonância, trabalhar o externo também é uma forma de cultivar o interno.

Isso significa que o trabalho estético nem sempre é tão superficial quanto imaginamos. O trabalho sobre a pele, apesar de externo, transforma também internamente, altera certas configurações do seu olhar sobre si mesmo, e do olhar dos outros sobre si. Se tatuar e se vestir é uma forma de se situar socialmente, de ser visto de determinada maneira e afeta a forma como nos comportamos em público; ou seja, trabalhar a pele, com a tatuagem, já altera a predisposição interna. Um desenho na pele já identifica e localiza o indivíduo de outra forma, tanto pra si mesmo quanto para os outros (nós influenciamos os outros muito mais do que imaginamos, através da visão que eles tem sobre nós!).

Arte de Mari Dagli – Banho de Rio: Nanquim, sanguínea e aquarela sobre papel 300g/m2.

Também tenho pensado sobre a escolha dos desenhos de tatuagem pelas pessoas. O desenho escolhido tem uma ligação interna ligada à estrutura inconsciente (alguns psicólogos dizem que a tatuagem é uma máscara que esconde nosso lado interno, mas eu acredito que esteja mais pra uma expressão do que está lá dentro).
A primeira identificação com o desenho pode parecer só um interesse “aleatório”, mas esse interesse pode ser aprofundado com relação ao seu passado, sua história de vida. Sempre temos uma ligação inconsciente com os símbolos que selecionamos pra nossa vida. Nenhuma seleção é por acaso (pra quem gosta do Carl Gustav Jung, é a sincronicidade que atua na tatuagem!, nosso inconsciente seleciona os símbolos que nos circundam).
Porque você se interessa em tatuar garranchos, ou então pela estética do neotradicional? Esse interesse é seu – completamente seu, inconsciente e ligado à sua história -, ou existe uma influência da mídia que valoriza certas formas de arte? Sempre existe influência do contexto, mas temos que voltar um pouco mais o nosso olhar pra aquilo que é internamente nosso.
Todo esse questionamento importa, e essa reflexão pode ser rica pra alma.

Arte de Mari Dagli – Casa e Janelas: Nanquim, vinho e tinta ecoline sobre papel 300g/m2. 29,7 x 21cm

Ainda sobre as motivações da tatuagem, não acredito que ela possa, sozinha, ser um processo de cura de uma dor interna; mas ela pode, sim, ser parte de um processo de autoconhecimento, parte de um entendimento sobre o seu próprio ciclo de vida. Pode ser a conclusão de um largo processo psicológico, ou aquele empurrãozinho que precisávamos pra nos sentirmos bem em algum aspecto de nossa vida – por exemplo, se tatuarmos algo bonito em alguma região do corpo que antes ignorávamos por considerarmos feia, deformada, e com a tatuagem voltamos a enxergá-la como parte de nós mesmos.
Na verdade, acredito que a tal da “cura” não exista assim, de uma hora pra outra. O que existe é processo, porque a vida é processo, descobrimento, desvendamento. E isso não é um ponto negativo sobre a tatuagem: desvendar sobre si mesmo é a parte mais interessante da vida. Esse desvendamento pode se dar com o tempo, através da reflexão sobre as escolhas dos elementos que farão parte do nosso corpo em uma tatuagem.

Tatuagem não é cura em si porque a tal da superação de alguma dor interna vem de um largo processo, doloroso, muito mais doloroso do que 12 horas de agulha na pele. Desconfie de quem propõe curas imediatistas, pois a cura se dá em processo dinâmico.
Se a vida é cíclica, o fim não está em nenhum ponto além da morte. Se a cura fosse um fim a ser atingido, ela seria a morte (psíquica): se não há mais nada pra curar, pra conhecer e descobrir sobre nós mesmos e nosso entorno, a vida deixa de existir. Dizer que “a vida é cura” não quer dizer que ela é constante sofrimento: quer dizer que é continuidade, FLUXO.
Gosto de água por isso: é um elemento que retrata exatamente o que eu penso sobre a vida. Ela é correnteza.


Imagem de capa: Photo by MChe Lee on Unsplash


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